quinta-feira, 31 de março de 2011

Abraço de palavras

É muito estranho se surpreender com situações que você já viveu, mesmo sabendo como será cada capítulo da história, milimetricamente  narrada em sua mente com antecedência, você ainda consegue se encantar com o desfecho, ou desencantar de vez. Por quê? Por que as pessoas tem essa capacidade imensa de olhar para algo como se fosse a primeira vez? Por que ainda dói? Será mesmo que acontecerá o mesmo final de sempre? Por que esse medo? Por que tanto receio? Ou seria precaução? Ou seria a tão falada sabedoria adquirida com o passar dos anos dando o ar da sua graça? Será? Será covardia? Ou será precaução? E agora? Quantas perguntas, não é? Onde está a resposta? Eu não sei. Na verdade, não sei exatamente o porquê estou escrevendo isso... E nem é para saber, nunca foi. Também não é para entender. É somente para sentir, e isso, eu sei fazer.




"Eu não tenho cabelos vermelhos e o meu vestido não é amarelo. Eu sou só uma menina invisível, deitada na grama invisível que a moça que não sabia desenhar, não desenhou. Aquele é o menino que eu não lhe falei. Ele sempre está preso num único instante; o instante em que o moço que sabia desenhar, o desenhou.


O balão que subia as nuvens, com várias crianças chamando, teve de desviar o caminho, pois não fazia parte desse desenho. O avião que trazia uma faixa, com linda declaração de amor, teve de mudar a rota, pois neste céu azul é que não foi desenhado. O pombo-correio que veio voando de fora da imagem, bateu o bico na borda e caiu. Por isso, o menino está sempre só.


Se as crianças do balão não conseguiram. Se o avião também não conseguiu. Se nem o pombo-correio teve sucesso, como é que eu, uma menina invisível, feita de palavras, poderia chegar até ele? Foi o que passei dias e dias pensando. Então, numa de minhas viagens, ouvi dizer que uma imagem valia mais do que mil palavras. Não tive dúvidas. Abri a oficina invisível, acendi as luzes transparentes e comecei a construir este imenso abraço de palavras. De mil e duas palavras. Para, um dia, entregar a ele."



Rita Apoena 

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